Mais uma grande história está sendo apagada por conta do avanço do mar em Atafona, 2º distrito de São João da Barra. Tristeza, lembranças e muitas saudades são os sentimentos relatados por Sônia Ferreira que viveu 24 anos de sua vida com alegria na praia de Atafona, mas com medo de ver a hora de ter que deixar sua casa.

– Olha do jeito que está. Olha o mar chegando, está na porta da minha casa. Não dá mais tempo para esperar, infelizmente! Chegou o momento de deixar nossa história -, destacou Sônia.

Segundo especialistas, o que acontece é um fenômeno de transgressão do mar, que nos últimos 35 anos avançou três metros a cada 12 meses. Através de uma pesquisa, cerca de 20 ruas e mais de 500 casas já foram engolidas pelo mar.

– Nos construímos essa casa há 42 anos, onde era uma casa de veraneio, fim de semana. Enfim, eu sempre tive o desejo de morar em Atafona. Há 24 anos, eu consegui realizar esse desejo, esse sonho, e estou aqui morando em Atafona. Durante esse período, a gente segue acompanhando com muita tristeza essa erosão que o mar provoca na orla. Acompanhei muitas casas sendo destruídas, a tristeza de muitas famílias -, contou Sônia.

Foto: Parahybano

Em 2008, no dia 05 de abril, o prédio que era uma referência de Atafona, conhecido como prédio do Julinho, que ficava exatamente em frente à nossa casa, caiu sobre ele mesmo depois de ficar muito tempo erodido pelas forças da águas. Depois que esse prédio caiu, eu comecei a ficar um pouco balançada, pois teoricamente, eu seria a próxima. Isso demorou exatamente 11 anos depois da queda do prédio para então cair o primeiro pedaço muro da minha casa que aconteceu em 2019 -, acrescentou.

Sônia relata ainda que, de 2019 até hoje, o avanço mar está tendo uma rapidez muito grande.

Foto: Parahybano

“Somos surpreendidos com marés muito altas. Estamos tendo apoio enorme da Defesa Civil, pois quando vem a maré muito alta eles chegam, avisam, ficam juntos. Há dois anos o mar está vindo com muita força. Basta dizer que a casa dos meus vizinhos aqui de frente, caiu de repente. Eles estavam em casa ainda, quando o mar chegou e levou um pedaço da casa. Daí entrou todo mundo para desmobilizar a casa, tirar as coisas, eles estavam com a casa toda montada, assim como eu estava.”

Para Sônia, é muito aflitivo, triste, ter que sair de um lugar que nos traz tantas lembranças boas, tantas lembranças queridas de pessoas que não tem mais ao seu lado, que já se foram.

Foto: Parahybano

– A gente vai perdendo esses recantos. A memória fica com a gente para sempre, mas os cantinhos que elas gostavam de usar, esses cantinhos a gente vai perder. Mas, é isso! Tenho pedido muito à Deus que me dê força, pois não é fácil ter que tomar essa decisão. O mar está colado aqui em casa e não tenho mais tempo para esperar -, disse.

Com muita tristeza, ontem, 20, Sônia, com ajuda de amigos, iniciaram o processo de desmobilização da casa, tirando todas as coisas de dentro dela.

Foto: Parahybano

“A partir deste sábado, 21, já vai começar o processo de desmonte da casa. Infelizmente não tenho mais espaço, mais tempo para aguardar, pra ver que alguma coisa pudesse ser feita, Enfim, que Deus permita que consigam fazer alguma coisa para preservar as casas de outras pessoas. É uma experiência muito dura, é muito triste! Se não é Deus para dar força, eu não conseguiria falar com vocês agora.”

Neste sábado, 21, a partir das 19h, vai ser realizado na casa de Sônia o evento denominado “Memória em Moinho” e haverá a exibição dos filmes Mar Concreto e Museu Ambulante.

Foto: Parahybano

O Filme Mar Concreto, que será exibido no evento, traz o testemunho de Sônia Ferreira sobre a história da crise ambiental que vive Atafona. Ele tem a direção de Julia Naidin, pesquisa de Fernando Codeço e foi produzido pela Casa Duna. O filme já foi exibido em festivais na Grécia, Paris, Canadá e na Turquia. Haverá outras apresentações artísticas durante a noite. Após esse encontro, a casa continuará será desmontada e posteriormente demolida.

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