A família comunica com pesar o falecimento de Luiz Ronaldo Neves, aos 89 anos, pai do atual secretário de Turismo de São João da Barra.
Casado com Dircélia Raposo, proprietária da antiga Papelância, Luiz deixa filhos, netos e bisnetos.
O velório está sendo realizado na Capela Mortuária de São João da Barra e o sepultamento está marcado às 11h30 desta segunda-feira (23), no Cemitério São João Batista.
Foto 70: Luiz Ronaldo Neves, operando o telégrafo, naEstação Ferroviária de São João da Barra, em 1961. Acervopessoal da família Raposo Neves.
O ex-ferroviário, Luiz Ronaldo Neves, tem muitas memóriasdo período de sua passagem pela Rede Ferroviária Federal. Quando criança acostumava frequentar a Estação de São João da Barra, onde seu pai, Sr. Francisco Ribeiro Neves era o manobrador de trens. Daí, vendo o importante trabalho de seu pai, gostou daquele movimento todo, decidindo também que iria trabalhar no futuro na Rede.
Luiz Ronaldo Neves, depois de ingressar na Rede Ferroviária Federal, se aplicou muito aos estudos de operacionalidade das estações, seus protocolos internos, tarifas, despachos e recebimentos de cargas etc
Mas a sua paixão maior era o de operar o telégrafo das estações aos quais passou. Segundo Luiz Ronaldo Neves, paracontrolar o movimento dos trens era usado o MORSE,aparelho telegráfico que funcionava através de sinaisrepresentando o abecedário. Também era usado para emitir ereceber telegramas.
Na Estação de São João da Barra, Luiz Ronaldo Neves começou a trabalhar de março de 1960 a agosto do mesmoano. Depois, segundo ele com sua infalível memória, foitransferido para a Estação de Barcelos, no sexto Distrito, bem aos fundos da Usina Barcelos e próximo às margens do rioParaíba do Sul. De Barcelos voltou para SJB para substituir o chefe da estação, em princípio de janeiro de 1961.
Ele começou a praticar com Antenor Lobato, na função deauxiliar de estação. Depois, o Sr. Antenor Lobato foi para a estação de Itaperuna.
Segundo Luiz Ronaldo, com a ida do competente Sr. Antenor Lobato para a Estação de Itaperuna, ele relaxou noaprendizado. Ronaldo agora estava em Barcelos. DepoisRonaldo voltou à Estação de São João da Barra, com outroagente, era o Sr. João Melo, que veio de Campos.
Da Estação de São João da Barra, Luiz Ronaldo começou a conhecer cada vez mais as estações que se interligavam no grande emaranhado da Rede Ferroviária Federal. Foi parar na Estação de Barão de São José, em São Sebastião, na vizinhacidade de Campos dos Goytacazes. De lá, Luiz Ronaldo foipara o local considerado um dos três melhores climas do Brasil, no Estado do Rio, na Estação de Madalena. Tinhaestação que tinha um anexo que servia de casa para o agente.As que não tinham, o agente se hospedava em pensões ou pousadas. Em São João da Barra existia a casa do agentecolada de fundos na estação. Saía da casa e entrava naagência!
Foto: Divulgação
Ronaldo passou por muitos locais deixando as memórias de seu importante trabalho! ContouRonaldo que passou por São João da Barra, Campos dos Goytacazes, Miracema, Santo Antônio de Pádua, Cambuci(levou um bom tempo por lá), São Fidelis, Santa MariaMadalena e outras estações menores. Os ramais com estações menores foram: São João da Barra, Barcelos, Barão de São José, Posto Telegráfico Crespo, Maranhão, Guandu, SantoEduardo, Recreio, Santa Cruz, Ernesto Machado (levou umbom tempo por lá), Palmares, Pureza, Natividade…
Conhecida nos antigos documentos ferroviários como PostoTelegráfico Palmares, era inicialmente um prédio pequeno.Com o passar dos anos, o prédio foi aumentado para o portede pequena estação.
Esses deslocamentos feitos por Luiz Ronaldo a serviço daempresa, não tinham despesas. A empresa fornecia um passe par o funcionário se deslocar nos trens, mas o documento só valia para o trecho (ramal) de deslocamento do funcionário e não valia para outros ramais. O controle era rigoroso. E emmuitos casos tinha que levar, além do passe, um telegrama deapresentação no local de destino. Ninguém ia a passeio, afirmou Ronaldo!
Os serviços executados por Luiz Ronaldo nas estações em quepassava não eram poucos! Tinha que saber mexer muito bemno telégrafo – que era o meio de comunicação que ligava SãoJoão da Barra à Barcelos e Atafona. Até a previsão do tempoele fazia e recebia, recebendo e enviando informações viacorreios para distribuírem para outros locais. Tinha que ser umexímio despachante de cargas e descargas, arquivista,bilheteiro e até contador! A parte de limpeza externa e internada estação era feita pelo pessoal da via permanente, quetratava da linha. Cada dia era um funcionário da via permanente. O pai de nosso querido Ivaldo Sousa, contador de nossa cidade, o Sr. João de Sousa Ribeiro, vinha na via permanente para fazer o serviço.
Um fato curioso que Luiz Ronaldo contou é que em Atafona tinha um Sr. chamado Tuffy Nascif (marido de CarmelitaMoraes Nascif, professora – que dá nome de avenida emAtafona), que recebia muito telegrama e passava também. Eraum filho dele que morava em Macaé. O Sr. Nascif ia para aEstação de Atafona, aguardava ser atendido pelo agente local,pedia para passar um telegrama para a Agência de São João daBarra, aí o Luiz Ronaldo transcrevia a informação emdocumento oficial da Rede Ferroviária Federal e passava para os Correios da Agência de São João da Barra, que ficava onde hoje existe o Banco do Brasil. O carteiro era “Zequinha Bongosto” (que tocava clarinete e saxofone). A Agência dosCorreios de São João da Barra tinha outro telégrafo, afirmouLuiz Ronaldo. Era tecnologia de ponta! De ponta de fios!
O carteiro da época era “Zequinha Bongosto ” (que tocavaclarinete e saxofone). Era pai da saudosa amiga Dona Lígia, avô de Marinês Azevedo, de Jussara Vianna Cardozo e Edilamar Vianna Cardozo. Também foi carteiro na época detrabalho de Luiz Ronaldo na rede, o famoso “Alberto Siri”(também barbeiro), parente do autor deste livro.
Ronaldo conta muito feliz dos telegramas que ele e sua esposa, a minha prima Dircélia Raposo, receberam de váriosamigos e amigas pelo casamento de ambos. A Dircélia tem atéhoje guardados os telegramas do casamento, que tem 57 anos de casados.
Segundo Ronaldo, naquela época não existia as impressoras que têm hoje nos computadores modernos. Os telégrafospossuíam os estiletes por onde saía a fita com as palavras emtraço e ponto
– era o código Morse. Aí tinha que ler na fita e escrever numimpresso próprio, timbrado de rede. Era muito trabalho. O estilete ia batendo e perfurando a fita em ponto e linha.
Luiz Ronaldo lembra ainda que nas estações em que trabalhoexistiam os ajudantes de embarque e desembarque. Recorda ainda que seu pai, que foi manobrador, também pegava no pesado. A Fábrica de Conhaque de Alcatrão de São João da Barra ia para despachar conhaque. Quando ia despachar a carga (as caixas), a própria fábrica mandava seu pessoal para embarcarem as cargas nos vagões. Também quando iamcarregar os vagões da Fábrica com “palhões”, o também Sr.Rizzio mandava seus funcionários, Zeca Lopes, João França e Nilton Valiengo para embarcarem as mercadorias.
Teve também a época da abóbora onde, Chico Léo – pai de Francisco Cunha e o “Rio Grande”, trabalhavam arduamente para carregarem os vagões com abóboras para abastecerem o Rio de Janeiro.
Luiz Ronaldo lembra bem quando a Fábrica de Conhaque dealcatrão de São João da Barra adquiriu dois vagões enormespara transportarem o conhaque, que ficavam estacionados nodesvio. Segundo ele, despachavam muito mesmo! Iam para o Rio de Janeiro. Às vezes os dois juntos, as vezes separados. Intercalavam. A embalagem do conhaque era em caixas e o litro era revestido de “palhão” dentro da caixa, afirmou LuizRonaldo.
Outro fato bastante curioso que descobri na entrevista com oLuiz Ronaldo Neves foi que o belíssimo uniforme que oagente da estação trajava, a Rede Ferroviária Federal não davaaos seus funcionários. Ela era comprada com o dinheiro do próprio salário do ferroviário. Não dava roupa e nem quepe.Tinha uma loja no Rio, próximo da estação de Barão de Mauá que vendia.
E por falar em dinheiro, a Rede Ferroviária Federal era bastante organizada, afirma Ronaldo. Não era tão moderno como hoje, mas era um serviço organizado. As rendas, por exemplo. Eram relacionadas em um livro – de tamanho daqueles livros cartoriais – e depois passado de um para outro,de acordo com as instruções. E tinha a bolsinha de lona, osfamosos “malotes” dos filmes de faroeste, que o pessoal botava dinheiro e lacrava, para entregar no trem que ia levar para Campos dos Goytacazes. E no final do mês, era praxe o Ronaldo trazer uma porção de notas para serem contabilizadasem livro próprio, onde a Dircélia, foi grande ajudante domarido nas conferências de cálculos, usando as tecnologias precárias da época, como a máquina de calcular à manivela que utilizavam. Dircélia depois apareceu com a primeira máquina de visor digital, que foi presente da mãe, o que foi uma novidade. Mas a facilidade mesmo chegou, quando comprou a máquina de calcular com bobinas impressas, afirmou Dircélia, toda orgulhosa. O trabalho era assim: Dircélia ia ditando e ele ia batendo, ela ditando e ele batendo! E quando errava? Nossa, que sufoco! Tinham que revisar tudo novamente! A facilidade veio com a bobina impressa, pois na hora da revisão de número por número, era mais fácil de identificar o erro de digitação. Uma grande ajudante domarido e agente de estação! Segundo, Ronaldo, era um trabalho cansativo e de muita atenção. Tinha que fechar tudo direitinho, centavo por centavo! Nem sobrar e nem faltar na contabilidade! Um trabalho rigoroso que foi executado,principalmente, na Estação de Barcelos.
Foto 72: Luiz Ronaldo Neves, Agente da Estação de São João da Barra abrindo o cofre com olhar desconfiado. Acervo daFamília Raposo Neves.
Luiz Ronaldo Neves, relatou de forma bastante descontraída mais um fato bem pitoresco que acontecia com frequência nas estações das regiões em que trabalhou e pode presenciá-las.Disse Ronaldo que quando chegava “gente nova” nas gares (estações) para trabalharem, as moças da localidade inventavam um meio de irem se pesar nas balanças de controle de cargas dos armazéns das mesmas, no intuito de puxarem assuntos com estes novos funcionários. Em muitos casos, vi terminarem essas situações em “namoriscos”, afirmou muito gargalhante o ex-chefe da estação, Luiz Ronaldo.
Quando chegava um trem à estação, ela fervia de gente. Era um acontecimento em cada local. Por exemplo, lá em Santo Eduardo (Campos dos Goytacazes) a estação ficava cheia! Tinha o trem noturno, que vinha do Rio de Janeiro, parava em Campos dos Goytacazes (Santo Eduardo) pela manhã e ia paraCachoeiro. A estação ficava cheia de moças passeando,esperando o trem chegar e quando chegava era aquela festa, vendo os parentes chegando. Luiz Ronaldo afirmou que SantoEduardo era uma estação de movimento!
Depois que o Ramal Campista (que ligava Atafona à Campos) foi extinto, Ronaldo estava como Agente da estação deMiracema. Foi nesse período, em 1962, que ele recebeu otelegrama da rede sendo informado que o referido ramal estava extinto. Os trens iam parar! O Ronaldo se sentiu commuito pesar. Ficou bem triste. Ele começou a presenciar todo aquele movimento de retirada dos trilhos para ser colocado oasfalto. Foi coisa rápida! Um outro fato curioso e histórico éque teve até clamor de empresário local, o Sr. amaro Coelho(que tocou o Cine Teatro São João por alguns anos), quetentou arrendar o ramal, assumindo a operação, mas nãoaceitaram.
Segundo Ronaldo, não houve sequer um movimento de mobilização do povo contra a extinção da ferrovia. Um povomuito pacífico e que a tudo aceita.
Com aquele movimento todo de retirada de trilhos, colocaçãoasfáltica aqui e acolá, Ronaldo trouxe mais um fatointeressante sobre a rodovia BR 356. A rodovia estava sendoasfaltada a contento, no entanto a ideia era de se asfaltar até a Estação de São João da Barra. Atafona ficaria de fora. São João da Barra seria o pontofinal. Surge então a figura de Jorge de “Wilson”, ou o cidadãoque já foi vereador do município, Jorge Batista Meireles. O Jorge apelou para o governador que, à época, era do partido dele, e também ao Deputado Aristóteles (…). Aí, Jorge Batista Meireles conseguiu puxar o asfalto até Atafona.
Depois de Ronaldo casou-se com a Dircélia Raposo, ele foi para a “Campos Cargas”. Aí, o agente de Estação de Barcelos se aposentou e a rede o mandou para assumir a Estação de Barcelos. Por lá permaneceu por sete anos e depois retornoupara a “Campos Cargas” até se aposentar, afirmou. O grande movimento na “Campos Cargas” era o transporte de açúcar. Mas também transportava outras coisas diversas. Tinha otransporte rodoferroviário que fazia o serviço de buscar oaçúcar nas usinas, de caminhão para botar nos vagões. E também era responsável pela documentação de cargas de petróleo que vinham nas composições vagões-tanque, para a localidade de Cacomanga, quase em Ururaí, Campos dos Goytacazes.
Ronaldo contou que durante a sua estada como Agente de Estação em Barcelos, dificilmente embarcava passageiros naquele trecho. A estação basicamente atendia a usina para despachar vagões de açúcar, álcool etc
Tinha o trem da usina que ia até Travessão. E quando chegava em Campos, atravessava a rodovia para chegar na Fazenda chamada “Piriquito”. E na volta vinha trazendo o trem de cana como tinha tráfego também para o São Bento. Todo esse caminho de trilhos do Taí grande, Taí pequeno e São Bento também foi retirado, anos depois. O Luiz Ronaldo Neves, nesse período, conheceu muito o maquinista da UsinaBarcelos, o Sr. Moacir Carolino dos Reis, que rodava toda aregião com a Maria- fumaça.
Ronaldo e Dircélia também recordaram os momentos do tremde turismo, que rodava aos domingos, quando o Ramal Campista da Rede Ferroviária Federal estava em funcionamento! Era uma festa total! A estação fervia!
E o trem do Conhaque? Quando Joaquim Thomás foi o tesoureiro na festa de São João Batista, em 1950, ele fez o“Trem Conhaque”! Trouxe todos os sanjoanenses quemoravam no Rio de Janeiro. O trem veio do Rio até aqui,afirmou Luiz Ronaldo. Foi a festa do centenário de São Joãoda Barra, em 1950. Quantas recordações!!!
E os terrenos pertencentes à Leopoldina Railway e que passaram para a Rede Ferroviária? Ronaldo explicou que as terras de Atafona até lá em Grussaí, tudo pertencia à Rede Ferroviária, mas os que exerciam direito de posse, pagavam um aluguel para a Leopoldina. Todo mês vinha o comprovantepara os posseiros de boa-fé pagarem. Depois que a Leopoldina fecho, ficou ao Deus dará, afirmou. O sanjoanense Murilo Henriques, filho de Coriolano Henriques, que se tornou advogado da rede, sempre vinha em São João da Barra paraprocurar os inadimplentes, durante um bom período. Teve umavez que surgiu uma notícia de que a rede ia cobrarseveramente os alugueres. Chegou a cobrar! Mas Paulo Feijó, que é filho de Campos dos Goytacazes, como deputado, conseguiu abafar. Feijó era advogado da rede também. Ninguém pagou.
Outro fato pitoresco e que merece toda a nossa análise, foi a de que, com muitos anos de trabalho nos diversos locais que passou, Ronaldo nunca tinha sido sabedor, ou tinha presenciado, a mão de obra feminina atuar pela RedeFerroviária Federal em suas atividades do dia a dia. Sóquando estava próximo a se aposentar, na década de oitenta, que Ronaldo conheceu uma colega de trabalho da rede, que veio de Minas Gerais para trabalhar na “Campos Cargas” como Agente de Estação, já sendo uma pessoa idosa.
Foto 73: Estação de São João da Barra. A despedida dealguém. Pessoa não identificada. Acervo de Maria Helena Azevedo
Foto 167: famílias sanjoanenses aguardando a chegada do trem do Ramal Campista. Era um acontecimento diferente.Fonte: redes sociais, internet.