Candidato à certificação em 2013 pela Internacional Herity — organismo da Unesco voltado a museus, monumentos, bibliotecas, arquivos e sítios arqueológicos para gestão pública ou privada — a antiga residência do comendador de escravos André Gonçalves da Graça, hoje funcionando como Fórum da Comarca de São João da Barra, serviu também para hospedar Pedro II durante suas visitas imperiais à região, em 1847.
O edifício, datado do século XIX é uma construção imponente no centro histórico e que chegou a ser um dos mais confortáveis da cidade, segundo historiadores como João Oscar do Amaral Pinto, e assegurava ao proprietário através de uma torre que se ergue de um dos cantos do corpo do imóvel — ponto mais alto da cidade na época — o privilégio de ver chegar, primeiro entre todos, os navios carregados de escravos, quando ia ao Cais para escolher os melhores para suas atividades.
Com 737,72 m² e 17 cômodos, o antigo solar foi destinado ao Tribunal de Justiça, nas alçadas cível, penal e administrativa, o que exigiu importantes adequações do espaço. Internamente, existem duas salas para as audiências. Há intenção do município, em um futuro próximo, de criar no local uma instituição cultural para visitação pública, que hoje só pode ser feita com solicitação prévia.
— Não houve pontuação no quesito visitação para a certificação, cujas condicionantes eram as de o espaço estar funcionando, receber público e ter no mínimo 20% de seu projeto aprovado e em andamento, como patrimônio cultural. Foi uma pena ver um patrimônio cultural como esse não ser otimizado, por causa de uso como repartição pública — disse o guia em Turismo Científico, André Pinto, que integrou a comissão com o pedido e participou, em 2012, do I Seminário Nacional de Museus e Centros de Memória do Poder Judiciário. “Vi o quanto se faz necessário que São João da Barra tenha naquele espaço o uso da tipologia museológica adequada. Na sala de exposições do evento, pude ver vários documentos pertencentes ao município, como alvarás, inventários, agravos etc. Há, no entanto, uma extensa lista de processos oriundos de nossa Comarca no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no Museu da Justiça, que ainda não foram catalogados. A direção do museu tem o interesse de fomentar a criação de espaços museais no interior”, concluiu.
Solar preserva linha arquitetônica original
Apesar das diversas intervenções feitas pela administração da justiça para adequação do espaço, as linhas arquitetônicas do prédio e os materiais utilizados na sua construção foram conservados.
Segundo o jornalista Carlos AA de Sá, o prédio residencial do comendador Graça é mais que um marco histórico, é a lembrança afetiva de uma São João da Barra que ficou no passado, junto com os sobrados do seu avô e bisavô, ambos na rua dos Passos, os geminados da Companhia de Navegação São João da Barra-Campos, na praça do padroeiro, a Fábrica de Vinho de laranja, na atual rua Barão de Barcelos, todos derrubados entre outros mais. “Era a São João da Barra da minha infância, com suas histórias e mistérios. A meu ver, a graça e a leveza a dos prédios sanjoanenses da época do império deviam-se ao fato da cidade viver da prestação de serviço, enquanto que os prédios belos, mas pesados de Campos eram um símbolo de uma comunidade voltada para a produção de bens, no caso, o açúcar”, explicou.
Novo fórum — A construção de um novo prédio para o Fórum de São João da Barra. Faz parte de um debate que teve início em 2011. O município, inclusive, fez a doação de um terreno ao judiciário.
Referência cultural e urbanística na cidade
A Comissão engajada na transformação do solar em uma instituição cultural aponta a importância urbanística do prédio e sua localização no Centro da cidade, como principais fatores para a sua nova destinação.
— A antiga residência do comendador é um patrimônio cultural ímpar, de muitas histórias, valores e afetividades. É uma pena que o mesmo não tenha tido ainda a devida comunicação e interatividade com a comunidade, como um legítimo espaço museal ou arquivo público da cidade —, disse o guia em Turismo Científico André Pinto.
Em 2007, André organizou um guiamento com professores e alunos da rede pública de ensino, por conta dos 160 anos da 1ª visita de D. Pedro II à Vila de São João da Praia.
Patrimônios reconhecidos: Apesar do solar onde funciona o fórum não ter recebido a certificação, já que não houve pontuação no quesito visitação, o centro de São João da Barra conta com cinco prédios certificados pelo Herity. O município é pioneiro no Rio de Janeiro e é o quinto no país a receber tal certificação.
Representantes do Herity estiveram em São João da Barra em novembro de 2013 e certificaram como patrimônio a Estação das Artes Derly Machado, o Cine Teatro São João, o Centro Cultural Narcisa Amália, a Igreja Matriz de São João Batista, o Palácio Cultural Carlos Martins e a Casa de Cultura João Oscar – Antiga Casa da Câmara e Cadeia Pública. A validade da certificação é de três anos.
Fonte: Folha da Manhã